Mais uma vez, nós brasileiros, enfrentamos os transtornos de uma nova reforma ortográfica. Para aqueles que, assim como eu, figuram entre os nascidos a partir dos anos cinqüenta do século passado, a novidade não entusiasma, mas também não amedronta, afinal, as cãs nos ensinam que com o tempo a única coisa que apavora é o próprio tempo.
Minha geração que não chegou a grafar pharmácia e outras curiosidades lingüísticas, mas aprendi que a língua é dinâmica e que a maioria das mudanças não acontece por decretos, mas resultam da prática dos falantes e que essas mudanças, posteriormente, acabam incorporadas no léxico.
Ao refletir sobre essa nova mudança ortográfica e nas muitas metamorfoses ocorridas na vida daqueles que, assim como eu, sobreviveu a ditadura militar, encantou-se com o melhor futebol do mundo na copa de 70 e se emocionou durante a mobilização nacional pelas eleições diretas, “Diretas Já!”, confesso, senti uma melancolia como se tivesse muros arriando dentro de mim.
O tempo passa e não nos damos conta disso. A ampulheta que marca as sucessões das gerações é silenciosa e anuncia, a cada por do sol, que a vida escoa, sem alardes.
A conscientização de que se está no segundo tempo do jogo não acontece de uma vez e sim em doses homeopáticas. A leitura deste script é subjetiva.
Em data que nem me lembro mais, abismou-me quando minha filha, com olhinhos de geração Shopping Center, ficou desentendida ao me ouvir dizer que já tivera uma coleção de LP dos Beatles.
(...)
Puts! Estou ficando velho. Pensei. Quando foi que isso aconteceu que eu nem percebi?
Na verdade, somos atropelados pela realidade quando abrimos os olhos percebemos que temos mais passado que futuro. “Mó locura, véi. Nóia pura.”, diriam os"mano" e as "mina".
De repente, nossa memória passa a apagar (leia-se: deletar) muitas informações antigas, pois entraram em desuso, ficaram obsoletas e não mais cabem no armário reservado às bugigangas com validade vencida.
Com o tempo aprende-se a aprender e descobre-se que muito do que precisamos para viver não está nos livros; muito não foi nem será escrito e outras coisas, embora escritas, discutidas e tesificadas não serão vividas.
O difícil de tudo isso é porque não há estágio preparatório ou ensaios, para a vida. Desde o primeiro momento, ao abrirem-se as cortinas do palco de nossa existência, já estamos em cena sem direito a dublês.
As mudanças por decretos são as que nos impactam mais doloridamente, porque violentam nossos hábitos, muitas vezes, já cristalizados pela repetição ao longo dos anos.
Não obstante os decretos, fevereiros foram acrescentados à minha existência de forma tão natural que, neste de 2009, ao contabilizar cinqüenta, agora grafado sem trema, confesso ter ficado um tanto quanto reflexivo. “E agora José?” Perguntei-me com a sensação de que o porvir já está sendo servido na mesa de meus dias e eu ainda não me preparei para degustá-lo.
Envelhecer é sem dúvidas um privilégio. O que nos assusta é que pensamos que isso só acontece com os outros.
Acredito que de uma forma geral, cada pessoa possui duas idades: uma cronológica, implacável, que promove as mudanças físicas naturais em nosso corpo e outra, que nem sei como denominá-la, que fica entrincheirada dentro da mente e se incumbe de promover a resistência. É a negação, consciente ou não.
Neste meu rito de passagem, ainda meio sem jeito com este chip de cinqüentão, digo, cinquentão (sem trema), inserido em meu hardware de carne e osso, penso: o que é envelhecer? Até onde isso é um estado de espírito?
A revista Veja publicou em 2006, uma reportagem intitulada “As idades do corpo”. A matéria diz que: “O envelhecimento é determinado por uma intrincada cascata de acontecimentos que afeta as diferentes estruturas do corpo. Em linhas gerais, o que se tem é que certos marcadores biológicos estabelecem que numa altura da vida comecem a cessar a produção de alguns hormônios. Com isso, o metabolismo se desalecera, o apetite sexual diminui, músculos perdem o tônus, ossos se desmineralizam. Grosso modo, o processo pode ser descrito como uma ordem superior que manda desligar pouco a pouco o corpo como a prepará-lo para a morte. As ordens químicas são dadas ao sistema imunológico, que perde eficácia, aumentando os riscos de doenças. As células ficam mais susceptíveis aos efeitos dos radicais livres – moléculas instáveis que agridem o DNA e podem levá-las à morte. Nem tudo isso acontece ao mesmo tempo ou com a mesma intensidade em todas as pessoas.” *
Não obstante o estímulo brochante, apaga tesão, que o fragmento acima descrito dá aos que vestem a camisa do time dos maduros, adotarei como verdade-possibilidade a essência da matéria que pode ser resumida nas palavras da própria articulista na introdução de seu texto:
“A Expectativa da vida do ser humano cresce em quase todo o planeta. Um século atrás, a média mundial era de 40 anos. Hoje no Brasil está em torno de 70 anos. A vida mais longa e saudável é uma das mais impactantes conquistas da civilização. Ela decorre da alimentação adequada, das melhorias sanitárias nas cidades, dos avanços da medicina de diagnóstico e da farmacologia. Mais significativo do que aumentar o ciclo vital é o fato de que o bem estar e a própria aparência da juventude podem ser prolongados por muito mais tempo. A medicina, os estudiosos do metabolismo e os pesquisadores da nutrição e da fisiologia têm atualmente recursos para atrasar o relógio biológico humano. Um homem de 70 anos pode ter hoje desempenho intelectual, físico e sexual semelhante ao que teve aos 40 anos. Uma mulher de 50 pode ter a pele lisa e suave que desfrutava aos 30 anos.” *
Assim, saúdo aqueles que fazem, da construção de seus dias, poesia em nome da vida. Alea jacta est.
Minha geração que não chegou a grafar pharmácia e outras curiosidades lingüísticas, mas aprendi que a língua é dinâmica e que a maioria das mudanças não acontece por decretos, mas resultam da prática dos falantes e que essas mudanças, posteriormente, acabam incorporadas no léxico.
Ao refletir sobre essa nova mudança ortográfica e nas muitas metamorfoses ocorridas na vida daqueles que, assim como eu, sobreviveu a ditadura militar, encantou-se com o melhor futebol do mundo na copa de 70 e se emocionou durante a mobilização nacional pelas eleições diretas, “Diretas Já!”, confesso, senti uma melancolia como se tivesse muros arriando dentro de mim.
O tempo passa e não nos damos conta disso. A ampulheta que marca as sucessões das gerações é silenciosa e anuncia, a cada por do sol, que a vida escoa, sem alardes.
A conscientização de que se está no segundo tempo do jogo não acontece de uma vez e sim em doses homeopáticas. A leitura deste script é subjetiva.
Em data que nem me lembro mais, abismou-me quando minha filha, com olhinhos de geração Shopping Center, ficou desentendida ao me ouvir dizer que já tivera uma coleção de LP dos Beatles.
(...)
Puts! Estou ficando velho. Pensei. Quando foi que isso aconteceu que eu nem percebi?
Na verdade, somos atropelados pela realidade quando abrimos os olhos percebemos que temos mais passado que futuro. “Mó locura, véi. Nóia pura.”, diriam os"mano" e as "mina".
De repente, nossa memória passa a apagar (leia-se: deletar) muitas informações antigas, pois entraram em desuso, ficaram obsoletas e não mais cabem no armário reservado às bugigangas com validade vencida.
Com o tempo aprende-se a aprender e descobre-se que muito do que precisamos para viver não está nos livros; muito não foi nem será escrito e outras coisas, embora escritas, discutidas e tesificadas não serão vividas.
O difícil de tudo isso é porque não há estágio preparatório ou ensaios, para a vida. Desde o primeiro momento, ao abrirem-se as cortinas do palco de nossa existência, já estamos em cena sem direito a dublês.
As mudanças por decretos são as que nos impactam mais doloridamente, porque violentam nossos hábitos, muitas vezes, já cristalizados pela repetição ao longo dos anos.
Não obstante os decretos, fevereiros foram acrescentados à minha existência de forma tão natural que, neste de 2009, ao contabilizar cinqüenta, agora grafado sem trema, confesso ter ficado um tanto quanto reflexivo. “E agora José?” Perguntei-me com a sensação de que o porvir já está sendo servido na mesa de meus dias e eu ainda não me preparei para degustá-lo.
Envelhecer é sem dúvidas um privilégio. O que nos assusta é que pensamos que isso só acontece com os outros.
Acredito que de uma forma geral, cada pessoa possui duas idades: uma cronológica, implacável, que promove as mudanças físicas naturais em nosso corpo e outra, que nem sei como denominá-la, que fica entrincheirada dentro da mente e se incumbe de promover a resistência. É a negação, consciente ou não.
Neste meu rito de passagem, ainda meio sem jeito com este chip de cinqüentão, digo, cinquentão (sem trema), inserido em meu hardware de carne e osso, penso: o que é envelhecer? Até onde isso é um estado de espírito?
A revista Veja publicou em 2006, uma reportagem intitulada “As idades do corpo”. A matéria diz que: “O envelhecimento é determinado por uma intrincada cascata de acontecimentos que afeta as diferentes estruturas do corpo. Em linhas gerais, o que se tem é que certos marcadores biológicos estabelecem que numa altura da vida comecem a cessar a produção de alguns hormônios. Com isso, o metabolismo se desalecera, o apetite sexual diminui, músculos perdem o tônus, ossos se desmineralizam. Grosso modo, o processo pode ser descrito como uma ordem superior que manda desligar pouco a pouco o corpo como a prepará-lo para a morte. As ordens químicas são dadas ao sistema imunológico, que perde eficácia, aumentando os riscos de doenças. As células ficam mais susceptíveis aos efeitos dos radicais livres – moléculas instáveis que agridem o DNA e podem levá-las à morte. Nem tudo isso acontece ao mesmo tempo ou com a mesma intensidade em todas as pessoas.” *
Não obstante o estímulo brochante, apaga tesão, que o fragmento acima descrito dá aos que vestem a camisa do time dos maduros, adotarei como verdade-possibilidade a essência da matéria que pode ser resumida nas palavras da própria articulista na introdução de seu texto:
“A Expectativa da vida do ser humano cresce em quase todo o planeta. Um século atrás, a média mundial era de 40 anos. Hoje no Brasil está em torno de 70 anos. A vida mais longa e saudável é uma das mais impactantes conquistas da civilização. Ela decorre da alimentação adequada, das melhorias sanitárias nas cidades, dos avanços da medicina de diagnóstico e da farmacologia. Mais significativo do que aumentar o ciclo vital é o fato de que o bem estar e a própria aparência da juventude podem ser prolongados por muito mais tempo. A medicina, os estudiosos do metabolismo e os pesquisadores da nutrição e da fisiologia têm atualmente recursos para atrasar o relógio biológico humano. Um homem de 70 anos pode ter hoje desempenho intelectual, físico e sexual semelhante ao que teve aos 40 anos. Uma mulher de 50 pode ter a pele lisa e suave que desfrutava aos 30 anos.” *
Assim, saúdo aqueles que fazem, da construção de seus dias, poesia em nome da vida. Alea jacta est.
ALMAQUIO BASTOS
* (NEIVA PAULA, As idades do corpo. Revista Veja, 24 de maio de 2006. P. 96.)
* (NEIVA PAULA, As idades do corpo. Revista Veja, 24 de maio de 2006. P. 96.)
Oi, queridão! É... a língua é dinâmica e as coisas ao nosso redor naturalmente mudam. Mas te digo que sinto uma falta incrível do trema (acho tão chique rs) e nos tiraram. E também acho lindo (pode rir) quando vejo em alguma reportagem a palavra pharmacia. Coisa linda. Não sei se a minha ótica é sem foco ou focada demais. Enfim... mas esse texto tá lindo demais, hein! Conteúdo pra dar e vender, como sempre showzaço de bola! Bjs, daqui.
ResponderExcluirrs.....realmente um conteudo pra nunca se esqueçer...mas sabe o que penso? ou melhor o que não penso? Vamos viver. depois pensaremos....Se parar e pensar vai perceber que ja se foi 50 anos......Relaxa.....
ResponderExcluirAdorei e sabia que tu e capaz de não so escrever como viver isto tudo. Beijos no teu coração. Mais uma seguidora. (Lya)
ótimo assunto ótimo mesmo mas ñ é o que eu estou procurandoooooooo
ResponderExcluirbjs♥
:)