domingo, 16 de agosto de 2009

O BELO SEXO DOS HOMENS


Em "O Belo Sexo dos Homens", filósofa narra redescoberta do corpo masculino


MARTA BARBOSA Colaboração para o UOL



Florence Ehnuel é o pseudônimo de uma filósofa e psicoterapeuta francesa ocupada em relacionar a filosofia à vida cotidiana. Professora bastante atuante em Paris, ela até já recebeu um prêmio da Académie Française, em 2004, por aplicar o que chamam filosofia moral. Não é, por assim dizer, uma mulher vazia, muito menos desocupada. E talvez ai esteja o ponto forte do seu livro "O Belo Sexo dos Homens" (tradução de Véra Lucia dos Reis, publicado no Brasil pela Objetiva).

Em "O Belo Sexo dos Homens", filósofa narra redescoberta do sexo masculino.
Bruna Surfistinha e Catherine Millet a parte, trata-se de um testemunho bastante detalhado da redescoberta do corpo masculino e o ressurgimento da própria sexualidade. Por volta dos 35 anos, Florence deixou o confortável espaço num casamento tradicional e se viu estimulada a viver aventuras amorosas. Não perdeu tempo.Dos encontros casuais, relatados com pouco romantismo no livro, mas com muito erotismo, Florence foi construindo um mosaico interessante de descobertas sobre o corpo masculino. Despertou, como ela própria faz questão de esclarecer, para as belezas do sexo, que não tem nada a ver com amor ou casamento, mas que se tornaram complementares na sua vida.A partir de suas próprias experiências, a autora vai liberando suas teses a respeito da sexualidade feminina. Aborda, por exemplo, a questão da poligamia em tempos modernos. Florence rejeita o sentido clássico de fidelidade. Desdenha qualquer relacionamento baseado no monopólio. "Parece que se apaixonar resulta em exclusividade, na concentração de toda a energia numa única pessoa", escreve. "Não sei por quê, mas eu diria que, para mim, é o oposto. Estar apaixonada por um homem me torna apaixonada por todos os lados."Da mesma forma, o ciúme é visto como alguma coisa no mínimo desnecessária. Justificado, no máximo, como uma reação espontânea, incontrolável algumas vezes. Mas como base de regra de vida, um sentimento sem sentido, alienante, para dizer o mínimo. A escritora se justifica usando uma comparação no mínimo inusitada: relaciona o homem a um pico dos Pireneus. "Acho-o esplendoroso e sonho em escalá-lo regularmente. Apesar desse entusiasmo, não gostaria que me dissessem que será a única e exclusiva caminhada que terei o direito de fazer na vida, ou até mesmo no próximo decênio."Mas não se engane. "O Belo Sexo dos Homens" não é um livro sobre a promiscuidade. Embora seja um relato capaz de deixar qual feminista de cabelo em pé, há um discurso social no testemunho de Florence. No fundo, parece o relato libertador de uma mulher que venceu a opressão sexual assumindo um papel de protagonista quando o assunto é sua própria sexualidade.A autora assume, por exemplo, certo prazer em ser frágil diante do homem. Diz que a força masculina é um ponto de atração na relação heterossexual, e que não há submissão alguma em ser carregada, cortejada, e tratada como um ser delicado no jogo da conquista. Também relata a observação do corpo como uma parte da relação sexual tão desejada quanto a penetração, ou o gozo. A escritora permite-se e defende o exibicionismo e o voyeurismo sem conotação patológica, mas sim como um estágio da intimidade, absolutamente necessário no espaço onde todo o desejo é permitido.Para dar crédito a suas teses sobre sexualidade feminina, Florence cita de Jean Renoir a Platão. Deriva do "Banquete", aliás, a lição de poligamia que a autora sustenta. "Platão ensina que o amor pelos belos corpos é o primeiro grau na ascensão para outros amores menos carnais e muito mais compensadores para a alma." Então tá.
"O BELO SEXO DOS HOMENS"Autor: Florence Ehnuel Tradução: Véra Lucia dos Reis Editora: ObjetivaNúmero de páginas: 112 Preço sugerido: R$ 39,90

http://entretenimento.uol.com.br/ultnot/livros/resenhas/2009/08/16/ult5668u114.jhtm

sábado, 15 de agosto de 2009

SEM MEDO DE MEDUSA




Meia dúzia de medusas
Não me assombrariam
Se nas sombrias sobras petrificadas
Vicejasse alguma poesia.

Narciso anão
Meu espelho
Seu rosto espelha

Incansavelmente
Contemplo a face amada
Na líquida lâmina espelhada.

Ser poeta é isto:
Admirar a musa
Ainda que medusa


BASTOS, Almáquio. Sob o signo de Eros, p. 67

Ilustrução capturada no site http://fantasy.mrugala.net/Greg%20Horn/

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

QUAL A "FUNÇÃO" DA LITERATURA?

Carta ao Professor

por Ricardo Azevedo.


Somos condicionados, pela cultura utilitária que nos rodeia e sufoca, a acreditar que tudo tem uma função. Trata-se de uma crença equivocada e desumana. As coisas mais importantes da vida costumam ser justamente aquelas sobre as quais não cabe falar em função. Qual a função da amizade? Qual a função do sublime? Qual a função da saudade? Qual a função da vida?

Embora não faça sentido falar em “função” da literatura de ficção e poesia, sua importância é indiscutível:

1. Através da literatura entramos em contato com temas humanos complexos, ausentes dos livros utilitários, mas essenciais: a paixão, a busca do autoconhecimento, a angústia, a luta do velho contra o novo, o ciúme, a confusão entre a realidade e a fantasia, a mentira, a existência de diferentes pontos de vista sobre um mesmo assunto etc.

2. Narrativas construídas acumulativamente, com começo, meio e fim, podem nos ensinar a elaborar o processo, portanto, o sentido de nossa própria vida. Para Varga Llosa a ficção “...goza daquilo que a vida vivida – em sua vertiginosa complexidade e imprevisibilidade – sempre carece: uma ordem, uma coerência, uma perspectiva, um tempo fechado que permite determinar a hierarquia das coisas e dos fatos, o valor das pessoas, os efeitos e as causas, os vínculos entre ações.”

3. A literatura, principalmente através da poesia, possibilita o contato direto com o discurso subjetivo. Compare o texto didático e impessoal “ A água ferve a 100º com “uma parte de mim/ é todo mundo/ Outra parte é ninguém/ fundo sem fundo/ uma parte de mim/ é multidão/ outra parte estranheza/ solidão(...)” *

4. Pode trazer personagens paradoxais, por vezes incoerentes, mergulhadas num constante processo de amadurecimento, lutando para construir o significado da própria vida ( e evitar a visão idealizada do homem, ou seja, sua apresentação com um ser esquemático, lógico e previsível, sem conflitos e sem humanidade).

A literatura tem outras ótimas qualidades, mas o espaço é curto. O contato com temas da vida concreta e com vozes diferentes das nossas pode, por meio da identificação, construir um extraordinário recurso de humanização e sociabilização. Em tempos de consumismo sem limites, individualismo doentio e coisificação do homem – com efeitos nefastos numa sociedade desequilibrada como a nossa – a leitura de ficção e poesia pode ter um papel regenerador e insubstituível.


  • Traduzir-se” de Ferreira Gullar, Toda Poesia, Rio de Janeiro, José Olimpio, 1991


Ricardo Azevedo é escritor, ilustrador e pesquisador. É autor, entre outros, do premiado livro Um Homem no Sótão (Ed. Ática, 2004) www.cartanaescola.com.br

VOLTANDO A FALAR DE SONHO

Sonho é matéria invisível Igual carícia de vento Pode ser lembrança vivida Ou coisas que invento. Quando meu coração Acorda sorrindo E diz...