Amiga, como são desnorteantes
os caminhos da amizade.
Apareceste para ser ombro suave
onde se reclina a inquietação do forte
(ou que forte se pensava ingenuamente).
Trazias nos olhos pensativos
a bruma da renúncia:
não querias a vida plena,
tinhas o prévio desencanto das uniões para toda a vida,
não pedias nada,
não reclamavas teu quinhão de luz.
E deslizavas em ritimo gratuito de ciranda.
Descansei em ti meu feixe de desencontros
e de encontros funestos.
Querias talvez - sem o perceber, juro -
sadicamente massacrar-te
sob o ferro de culpas e vacilações e angústias que doiam
desde a hora do nascimento,
senão desde o instante da concepção em certo mês perdido na história,
ou mais longe, dese aquele momento intemporal
em que os seres são apenas hipóteses não formuladas
no caos universal.
Como nos enganamos fugindo do amor!
Como o desconhecemos, talvez com receio de enfrentar
sua espada coruscante, seu formidável
poder de penetrar o sangue e nele imprimir
uma orquidea de fogo e lágrimas.
Entretanto, ele chegou de manso e me envolveu
em doçura e celestes amavios.
Não queimava, não siderava; sorria.
Mal entendi, tonto que fui, esse sorriso.
Feri-me pelas próprias mãos, não pelo amor
que trazias para mim e que teus dedos confirmavam
ao se juntarem aos meus, na infantil procura do Outro,
o Outro que eu me supunha, o outro que te imaginava,
quando - por esperteza do amor - senti que éramos um só.
ANDRADE, carlos Drummond de, in: Amar se Aprende Amando,
Rio de Janeiro, Record, 1987. p. 13 (Fragmento)
Nossa é maravilhoso esse amor que nos envolve.
ResponderExcluirTanto que dá medo...
Quero agradecer as palavras deixadas em meu blog
Deixo aqui um beijo