terça-feira, 20 de julho de 2010

SONETO EM SOL MAIOR



Acordado pelas lembranças no meio da noite,
Ouço os gonzos do desejo ranger sua agonia.
Sem piedade, pensamentos fustigam açoites
Que me fazem ansiar pelo nascer do dia.


Sei que o amanhecer me servirá no desjejum
Um réstia de sol pelo vão do telhado
E, mais tarde, o rei sol, que nos é comum,
Vestirá seu corpo nu com real manto dourado.


À nesga de sol, esparramada sobre a mesa,
Revelarei um pedido, no mínimo inusitado:
Sol, longe dorme, pomposa, minha musa.


Acorde-a com seu brilho e beijos de quem a deseja.
Mostre que esse poeta, pelo nó da distância atado,
Envia-lhe no calor da manhã sua saudade andeja.


BASTOS, Almáquio. Sob o Signo de Eros, Goiânia: 2007 p. 63

sexta-feira, 9 de julho de 2010

VARANDA DE LOUCURAS


Há um silencio de carinho

Nos corredores do mundo.
A população da terra,
Desenganada de afeto,
Espera resignada
O vídeo taipe da primavera que passou.


Ainda ontem, éramos crianças,
Brincando de construir futuro
No quintal da infância.
O tempo de amar
É escasso no ciclo dos mortais!


Por isso, em tuas mãos entrego-me,
Dispo-me de pudor
Para o ato do abraço.
Vem e faz de mim
A lúdica fantasia
Em teu alegre novelo
De sonhos impublicáveis.


Ao quedar-te embevecida,
Rompa o halo e o elo
Do medo.
Ao atar-me,
Dispa-se do pré-conceito
De amar o amor.


Abandone o sentimento
Milimetrado,
O prazer bem comportado,
Em que a vírgula
Determina o fôlego,
O gemido,
O grito.
Dispa-se inteira.
Rasgue o manual
De etiquetas em des
pe
da
ços
e livre, sirva-te de pêssegos
em minha varanda de loucuras.




Vem colher amoras maduras
Em meus galhos pejados.
Vem vestir-te de vento
No pomar deste outono
Que pode nunca mais existir.


No ciclo das estações
A única certeza é a alegria
Das borboletas
Que semeiam vida
No sexo das flores.


Vem olhar pela janela
De meus olhos o frio de afeto
Que faz lá fora de nossos corpos.
Vem mostrar-me a orquídea
Guardada entre suas coxas.


Deixa-me passear em teu jardim,
Sentir o aroma de flores exóticas
E colher frutos silvestres
Maduros de desejos.


Há um silêncio de carinho
Nos corredores do mundo!


BASTOS, Almáquio. Ciclo do nada. Goiânia:1996. p.71
Poema premiado em 2º lugar no Concurso Nacional Cidade de Mineiros – 1995.

domingo, 4 de julho de 2010

ESTÉTICA DO DESEJO


Desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo, desejo....Repito a palavra inúmeras vezes até sentir que a pronúncia soa despida de significados. Pura, tomo-a cuidadosamente nas mãos e a deixo permanecer inerte, sem cor, sem brilho, sem forma, sem sentido, presa, unicamente, a etimologia pênsil pelo fio de meu olhar que a mira como a um objeto desconhecido.



A concepção de qualquer palavra acontece primeiramente no mundo das ideias. Ali, a semente de todas pré existe. Antes de ser pensada, pronunciada ou escrita, ela pacientemente aguarda o momento da cópula metafísica, sinapse, quando signo e significante se juntam na formação do embrião que resultará na unidade mínima com som e significado e então poderá representar alguma coisa substantivamente e contentar-se, resignada, ao isolamento dicionário, o que não é pouco.


Mas, se ela se permitir a novas experiências e se acasalar com outras palavras de classes gramaticais diferentes, poderá, por exemplo, em seu acme, explodir-se em um orgasmo semântico na alcova de algum poema.


Isolada, a palavra é apenas palavra.  Desejo, por exemplo, é apenas palavra, ou seja, substantivo masculino, dicionariamente, definível e nada mais que isso. 

Mas em você meu desejo cresce. Por isso, quando olho seus olhos e vejo o que os seus não vêem, na volúpia de meus pensamentos, o paradoxo de concretiza e o mesmo desejo que me cega ilumina meus sentidos.


Isso é poesia.


Vencido, descerro as venezianas de minha mente e caminho rumo a luz da ilusão. Absorto, vejo-a nua na minha mente, não como a uma palavra, mas como a personificação do desejo que me incendeia. Vejo-a nua como a flor que, em manhã primaveril, abre suas pétalas e se entrega, sem pudor, ao beija-flor que a cortejou. Vejo-a nua como uma Ninfa que, distraidamente, povoa pensamentos sem se dar conta dos incêndios que provoca. Vejo-a nua, simplesmente nua, mulher, fêmea linda, musa que tinge de arco-íris meu imaginário.


Assim, desejo é mais que palavra.


A CAMINHO DE ONDE?

De maneira simplista, geralmente, pensamos em caminho referindo a distância, a espaço percorrido ou a percorrer. Sabemos que o horizonte ne...